sábado, 13 de abril de 2013

Dizem que a Europa está perto da Guerra. Será verdade?



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Ontem o Ministro das Finanças português parou o país e suspendeu todos os pagamentos com excepção de salários directos. Abundantemente citado, pela esquerda, contra esta decisão, está Krugman, que defende esta política, gravíssima, e que aqui resumo: há que parar a austeridade, dar crédito, fazer crescer o emprego, enquanto calmamente se desvalorizam os salários. Trata-se de adiar a miséria. Vou explicar-me: o grave é que mais cedo ou mais tarde alguém paga a conta e, ao contrário do que disse Keynes, no futuro não estamos todos mortos. Nós por exemplo, estamos vivos e a pagar as contas.
Não há nenhum intelectual, nenhum presidente da Europa, que não tenha avisado publicamente que a Europa “caminha para uma guerra”. Junker, ex líder do euro grupo, fê-lo publicamente este mês. Quantos, porém na esquerda, entre os intelectuais críticos do Estado, pergunto, lembraram, que antes da Europa entrar em guerra tiveram que derrotar-se várias revoluções? Dito de outra forma? Que guerra é esta que só tem um lado? E vencedores e vencidos antes de começar?
A queda tendencial da taxa de lucro é a lei da gravidade. Caiu e vai voltar a cair. Na produção norte-americana e não nas casas ou casinhas. Já “não há saco”, como dizem os brasileiros, para este comboio de superficialidades numa situação tão grave para milhões de pessoas. A crise não é financeira nem um problema de gestão.
A burguesia norte americana compreendeu bem isso. Deixou falir uns quantos bancos, despediu e queimou capital, o salário médio caiu, a produtividade aumentou (relatório da OIT), colocaram triliões na indústria de guerra da Boeing, na IBM e na GE, e estão, desde 2009, em franca recuperação.
Se a dívida pública (uma renda fixa de capital) é alta, isso é irrelevante desde que o capital rode sem parar, onde pode. A dívida pública só é alta se for paga – e os EUA sabem-no, junto com a Alemanha, melhor do que ninguém – os maiores calotes históricos estão nas suas mãos (1929, 1933, 1945, 1973). Nunca é demais lembrar que a guerra colonial portuguesa (1961-1974), por exemplo, trucidou o orçamento público mas fez as fábricas e os estaleiros das margens de Lisboa desabrocharem com o apoio imberbe de operários orgulhosos no seu trabalho – viam os ofícios sem compreender a máquina de guerra que estava nas suas mãos, enquanto a economia chegou a crescer a dois dígitos nos final dos anos 60! A falência pública só é um problema para o capital se acabar em falência privada.
A burguesia norte-americana empurrou o problema para a Euro imprimindo dólares. E isso faz-se sem revoluções quando se é o país com maior produtividade do mundo. A Europa viu-se a braços com a queda tendencial da taxa média de lucro (tão visível no estado de coma da indústria automóvel alemã, italiana e francesa em 2008!) e a combinação destes dois factores (desvalorização do dólar e queda da taxa média de lucro na indústria) levou quási ao colapso o crédito na Europa.
Um parênteses: sabem os caros leitores que a indústria automóvel alemã está isentada de impostos desde 2008, em lay offs permanentes? Sabem caros leitores que a Siemens virou-se para a saúde (dos cofres públicos, em parcerias público-privadas pelo mundo todo, em Portugal, com o Grupo Mello e Espírito Santo) e que a Fiat está em lay off 28 dias por mês? Mirafiori, um dia a maior fábrica de carros do mundo, na bela cidade de Turim, onde estive há uns meses, é uma espécie de Chernobyl, só tem bactérias invisíveis, nem um ser humano…
O eixo franco–alemão reagiu, empurrando a crise para a periferia da Europa. Mas não colonizou o sul da Europa, é preciso lembrá-lo! Quando se grita, como em Portugal, nas ruas, Que se Lixe a Troika é preciso lembrar que a Troika não aterrou sozinha, nem aqui, nem na Grécia nem, por outras vias, em Espanha ou Itália. Isto não é o Botsuana e sendo periferias são periferias num espaço central.
Explico-me e não sei explicar, lamento, sem usar esta palavra tabu, ainda, a burguesia, isto é os detentores dos meios de produção. Porque empresários também há pequenos e elites também há no movimento operário.
A EU e o FMI representam uma fracção da burguesia alemã e francesa que fez um acordo com uma ou mais fracções da burguesia portuguesa e do sul da Europa. Assente em algo como isto:
1 – Dívida pública paga com salários (ganha o sector ligado à Banca);
2 – Queda do custo unitário do trabalho para favorecer as exportações (capitais mistos do sul e do norte da Europa, Portucel, Grupo Mello, Amorim, Repsol Portugal, Nestlé Portugal, comunicações, etc.);
3 – Mercantilização dos serviços públicos (mais uma vez capitais mistos, na saúde o caso óbvio de associação entre o Grupo Mello e a Siemens Healthcare Global, mas muito mais longe será na segurança social, nos transportes, na educação).
O Ministro das Finanças diz que tem que cortar 4 mil milhões de euros mais, e diz que vai fazer na saúde, educação e segurança social. É um massacre, num país que já tem 42% de pobres e quase 1 milhão de pessoas dependentes de subsídios vegetativos para viver.
No meio deste panorama, agora, obviamente o sector da burguesia portuguesa ligada mais ao consumo interno, que foi destruído com a quebra salarial, está em pânico e por isso os partidos, os juízes, os reitores, os comentadores, os presidentes de câmara, todas as instituições do Estado, estão em conflito. Esse conflito, que nos chega à hora nobre nos jornais, expressa este outro conflito mais profundo: quem vai pagar a crise e quem vai ganhar com ela?
O PS e sectores do PSD críticos, que representam este sector, não vão fazer cair este Governo sem o povo na Rua, porque este Governo representa aquele sector da burguesia que está agarrado aos dinheiros públicos (dívida pública, PPPs) como um doente em coma ligado à máquina. Mas têm medo do povo na Rua, porque não querem nada a não ser que sejam eles a ir para o Governo agarrar-se ao respirador que lhe dá a vida, o dinheiro do Estado, o nosso dinheiro do Estado deles. E o Povo ainda não saiu à rua na esperança de que o PS e o PSD, sectores críticos, resolvam o que não podem resolver. Este imbróglio pode durar 16 anos como na República ou 19 meses como no 25 de Abril.
A mim, só me surpreende que tanto se fale de Guerra e ninguém diga a palavra Revolução.

Raquel Varela